Apesar de suas explicações se
aproximarem bastante do campo místico e religioso, as experiências de
quase-morte também vêm chamando atenção dos cientistas, que buscam explicações
neurológicas para a sensação de paz, o túnel misterioso e a luz vibrante tanto
descritas por pacientes que em algum momento já vivenciaram esta experiência.
Veja alguns das hipóteses propostas:
Defesa
diante da morte:
Uma pesquisa mostrada pela Gallup
(como citado no site da Sociedade Racionalista da USP), indica que cerca de 3%
da população dos EUA diz ter tido uma experiência de quase-morte. Entretanto,
um outro estudo com 58 pacientes apontou que cerca de 30 deles não estavam
realmente em perigo de morte, mas pensavam que estivesse. Seria a EQM um
mecanismo de defesa da mente?
O lócus ceruleus, por exemplo, é uma região do
encéfalo envolvida no mecanismo de liberação de noradrenalina, um hormônio do
estresse, durante um trauma; no caso das EQMs, o trauma seria o medo de estar
perto da morte. O lócus ceruleus está conectado com a amígdala e o hipocampo,
regiões que modulam a emoção e a memória, processos alterados durante estas
experiências. Este fato ajuda a confirmar o discurso elaborado pela Sociedade
Racionalista da USP de que todas as características das experiências de quase-morte
possuem alguma base na alteração do funcionamento normal do encéfalo.
Fatores psicológicos
As EQMs também recebem
explicações psicológicas, freqüentemente relacionadas com a reação diante de um
evento traumático (morte). Sabe-se que as EQMs marcam a vida dos indivíduos de
tal forma, que estes precisam se reorganizar psicologicamente, mudando a
personalidade, as relações interpessoais e a percepção da vida e da morte. A
possibilidade de morrer pode desencadear mecanismos de defesa, como a descarga
emocional e memórias intrusivas, que ocorrem também na “dissociação” e no
“transtorno do estresse pós-traumático”. (Greyson, 2007)
Neurotransmissores
Alguns pesquisadores propõem
ainda que a bioquímica dos neurotransmissores pode ser uma explicação para a
experiência. Indica-se o efeito de endorfinas e opióides endógenos, que estão
associados à mecanismos de defesa e são liberados em condições de estresse.
Menciona-se também a adrenalina, a serotonina, a vasopressina e o glutamato.
(Greyson, 2007). Em uma entrevista na revista Abril, K. Nelson informa que o
anestésico quetamina provoca experiências extracorpóreas, mas que EQMs podem
ocorrer sem o uso de medicamentos.
Fluxo sanguíneo e oxigênio
Outro fator importante em relação à compreensão da EQM é o fluxo
sanguíneo. Kevin Nelson (como citado no site da Sociedade Racionalista da USP),
em seu livro The Spiritual Doorway in the Brain – a Neurologist’s Search for the God
Experience (O Portal Espiritual
no Cérebro – a Busca de um Neurologista pela Experiência Divina), diz que
normalmente 20% do fluxo sanguíneo é direcionado para o cérebro, mas que este
mesmo fluxo pode abaixar para 6% antes de ficarmos inconscientes. Quando enfim
desmaiamos, o nervo vago (que se conecta com o coração) desloca a nossa consciência
para o sono REM, causando uma intromissão, onde se transita da vigília para o
sono. Essa intromissão pode acarretar em uma “paralisia do sono”, onde as
pessoas despertas experimentam experiências surpreendentemente vívidas e
incomuns.
Além disso, a redução do fluxo sanguíneo nos olhos é
uma explicação plausível para a visão do túnel de luz, pois a periferia da
retina é mais sensível para esta redução do que o centro e isto justifica a
percepção de um túnel (pontos de luz centrais). Greyson (2007) informa ainda
que o baixo nível de oxigênio (hipóxia ou apóxia) pode causar alucinação. Em
uma pesquisa feita pela força aérea americana, por exemplo, os pilotos foram
submetidos a uma grande pressão que diminuiu o fluxo de sangue e o oxigênio do
cérebro. Após a experiência, eles relataram ver o túnel, as luzes e a vida passando diante de seus olhos; veja o vídeo a
seguir:
Lobo Temporal
Uma área do cérebro
está recebendo destaque nos estudos de experiências místicas, esta área é o
lobo temporal (Greyson, 2010). Borges (n.d) afirma que Penfield presenciou
relatos sobre a sensação de deixar o corpo enquanto estimulava esta região do
cérebro. Em um experimento, que ficou conhecido como o "Capacete de
Deus", demonstra-se que após a ativação desta área são relatadas aparições
de entidades e luzes, experiências extracorpóreas, onde o paciente se sente
flutuar e vê seu próprio corpo dormindo, entre outras vivências incomuns. Veja
o vídeo a seguir:
Controvérsias
Parnia e Fenwick (2001) informam que a maior parte dos
estudos na área são retrospectivos, mas que um estudo prospectivo de um ano com
pacientes cardíacos não apoiou as hipóteses explicativas baseadas no nível de
oxigênio ou no uso de medicamentos, entre outras. A lembrança do que aconteceu
no período em que o cérebro estava debilitado e em que o paciente estava
inconsciente consiste em um dos dados que questionam a validade das hipóteses levantadas.
Estes mesmos autores afirmam a
necessidade de elaborar novos esquemas para explicar fenômenos subjetivos, como
a EQM; as pesquisas podem contribuir para a compreensão do que é popularmente
conhecido como espiritualidade.
Greyson (2007) também informa sobre os dados que
questionam a validade destas hipóteses: a percepção visual em cegos; a descrição
confirmada por terceiros de detalhes que ocorreram durante a operação ou de
eventos que ocorreram a uma distancia inalcançável pelos sentidos. Há também
casos específicos que foram monitorados fisiologicamente e que contrariaram as hipóteses
sobre o funcionamento cerebral durante uma EQM.
Todas as hipóteses listadas são plausíveis e recebem o
apoio de muitos cientistas, embora ainda não haja consenso sobre as suas
comprovações ou validade. Apesar dos avanços das pesquisas nessa área, a EQM
continua sendo um assunto misterioso para os cientistas, algumas falhas nas
explicações dão margem para se pensar EQM como um fenômeno espiritual. Porém, apesar de tudo, ainda não se sabe se a
EQM é propriamente um produto da mente ou do cérebro.
Percebe-se que
quando o assunto é apresentado pela mídia, explora-se o caráter misterioso
desse fenômeno ou se cria a tendência de confirmar alguma das explicações, ora
afirmando idéias da ciência ora afirmando suposições espirituais. Mas ao ler os
textos científicos, constata-se que são muitas hipóteses e pouco consenso; as
explicações propostas até agora precisam ser aprimoradas e podem até ser modificadas
a partir de pesquisas futuras.
Links
Link da revista Abril – entrevista com o cientista Kevin Nelson:
Link da Sociedade Racionalista da USP – a Neurologia das Experiência de Quase-Morte:
Bibliografias
Todos as referências utilizadas estão na página "Indicações de vídeos e leituras".
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